sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

“O QUE SIGNIFICA PROPRIAMENTE O SACRAMENTO?” [2]

Dando continuidade à publicação do resumo do artigo feito por Leonardo Boff, posto, agora, mais uma parte deste material. Uma boa leitura:


          Acerca do termo mysterion, através do testemunho mais antigo do termo, referiam-se a uma ação sagrada e cultual que, a partir de um rito, um fato soteriológico se faz presente. Ao realizar o rito, a comunidade adquire a salvação para si. Com o tempo, os mistérios deixaram o seu espaço sagrado, no momento em que os cultos não foram mais considerados como mistérios. Isto ocorreu porque o divino começou a ser procurado através de uma busca mais especulativa do fundamento divino, fazendo com que a ação cultual não fosse mais a principal via.
       Odo Casel resume a evolução do conceito (Mysteria) como ritos e celebrações secretas dos antigos mistérios, além de serem as diversas partes e os elementos dos mistérios (fórmulas de oração, alimentos e imagens). A filosofia e a teologia de cunho místico também incorporam o termo, fazendo com que, além da sua ideia litúrgica concreta, passe a ter um sentido mais abstrato teológico. Logo, mysterion, na teologia, é o próprio divino e tudo quanto se pode conhecer, simbolicamente, do divino (semelhança, imagem). Sendo assim, podemos observar um elo entre mysterion e sacramentum, já que o segundo também pode ser definido como divino, o oculto que está ligado com algo visível, que é tomado como símbolo.
No Novo Testamento, o termo mysterion teve uma conotação referente a um segredo escatológico, ou seja, um anúncio revelador dos fatos futuros, determinados pelo Pai, cuja revelação e interpretação são reservadas ao próprio Deus e àqueles que forem inspirados pelo Santo Espírito. Esta definição foi retirada do livro de Daniel e desenvolveu-se na leitura apocalíptica e, por conseguinte, exerceu grande influência sobre o Novo Testamento. Podemos ver a manifestação destes segredos a partir do mensageiro apocalíptico, através dos seus sinais e visões acerca do futuro reservado a Israel e ao mundo. É importante divulgarmos que a expressão mysterion também era muito utilizada no judaísmo do tempo de Jesus e que pode exercer outro significado além dos que nós já vimos até agora: “são comunicados ao mestre da justiça e aos seus iniciados. Desta forma, a comunidade é a fonte do segredo, guardando-o com todo cuidado (...). Até os pensamentos humanos e as leis do universo são chamados mysteria.”[1]
“Deus age na história e sua ação, cheia de sabedoria, manifesta-se sobretudo no fim dos tempos messiânicos para realizar definitivamente seu eterno desígnio.”[2] Esta expressão, que inicia o atual parágrafo, é a síntese do pensamento que despertou nos leitores e ouvintes do Novo Testamento, acrescentando, então, outro ponto fundamental: mysterion não é uma revelação ou uma ação de Deus. Ambas estão unidas, sendo, ao mesmo tempo, palavra e ação. O mysterion, no Novo Testamento, apresenta, ainda, quatro pontos. Estes itens contribuem para uma melhor compreensão acerca do tema: o segredo está junto de Deus antes de ser revelado; sua revelação concreta; o conteúdo do mysterion; os destinatários e anunciadores do mysterion.
Às vezes, temos uma ideia de segredo como algo reservado, que não deve ser alcançado. Aqui, quando nós estamos refletindo sobre a questão dos sacramentos, o ponto de vista é semelhante. O mysterion como algo inatingível à razão. Devemos, porém, ter a consciência de que este mysterion, diante de Deus, é um fato não revelado, no seu segredo junto ao Pai. Porém, aos poucos, ele nos é apresentado, seja através da palavra e ação, órgãos humanos (Ef 3,5), pela Igreja (Ef 3,10) que destina o segredo a todos os homens. Logo, o mistério cristão não é semelhante ao dos ritos pagãos, reservado somente aos iniciados, mas uma revelação que o Pai quer apresentar a todos.


[1] O que significa propriamente o sacramento? Leonardo Boff.
[2] Idem.


Continua...

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